Há aqueles que, por ignorância ou antes
por malícia, pretendem que o magistério da Igreja não é infalível a não ser
quando define os dogmas revelados por Deus; dizem eles que a Igreja se
desincumbe desse magistério [infalível] unicamente quando, com um juízo solene,
ela define um ponto de fé ou de moral, quer no seio dos Concílios, quer nos
decretos pontifícios. Essas afirmações são, todas duas, contrárias à verdade.
Para começar, o magistério da Igreja é
duplo: um extraordinário, outro ordinário.
O primeiro [o magistério extraordinário]
é unicamente aquele que se exerce por juízo solene, quando surgiram certas
dúvidas referentes ao entendimento dos dogmas, ou então ainda em razão de algum
erro pernicioso que ameace a pureza da crença ou dos costumes.
Já o magistério ordinário, porém, é
aquele que se exerce, sob a vigilância do Papa, pelos pastores sagrados
espalhados pelo mundo inteiro, quer por meio da palavra escrita ou falada nas
pregações e nos catecismos, quer pelo exercício do culto e dos ritos sacros,
quer pela administração dos sacramentos e todas as outras práticas e
manifestações da Igreja.
Esses dois gêneros de magistério são
afirmados em termos expressos pelo Concílio do Vaticano: “Somos obrigados a
crer, com fé divina e católica, em tudo o que está contido na palavra de Deus
escrita ou transmitida pela tradição, e que a Igreja, quer com um juízo solene,
quer com um ensinamento ordinário e universal, propõe à nossa crença como
revelado por Deus.”
Pretender que o fiel não esteja obrigado
a crer a não ser naquelas verdades que tenham sido objeto de definição solene
da Igreja seria redundar em dizer que antes do Concílio de Niceia ele não tinha
a obrigação de crer na divindade do Verbo; nem na presença real de Jesus Cristo
na Santa Eucaristia, antes da condenação de Berengário.
Em segundo lugar, a infalibilidade do
magistério extraordinário e do magistério ordinário não se estende unicamente
aos dogmas que Deus revelou, mas também às consequências que neles estão
contidas, e em geral a tudo o que com eles é conexo, a tudo o que é
indispensável para conservá-los intactos e protegê-los contra os ataques e as
armadilhas do erro. Sem isso, Deus não teria tomado medidas suficientes para
que os pastores sagrados estivessem em condições de preservar os fiéis contra
as fontes envenenadas, Ele não os teria provido dos meios necessários para
garantir eficazmente o depósito da fé que a eles foi confiado.
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Rev. Pe. Matteo LIBERATORE, S.J.
(1810-1892), Duas mentiras sobre a infalibilidade refutadas, 1888; trad.
br. por F. Coelho, São Paulo, set. 2015, blogue Acies Ordinata, http://wp.me/pw2MJ-2zv
Fonte: R.P. Matteo Liberatore,
S.J., Le Droit public de l’Église, Paris: Ed. Retaux-Bray, 1888, p. 113s; apud N.M.,
“Extrêmement rare ?”, 14 fev. 2009, em:
http://archives.leforumcatholique.org/consulte/message.php?arch=2&num=466501
http://archives.leforumcatholique.org/consulte/message.php?arch=2&num=466501