A alma existe para que o homem possa
constranger as naturezas do corpo e ordenar sua vontade para um bom fim, fim
que se encontra sempre acima da natureza corporal. Pois caso a alma não
existisse, o homem teria sido criado para uma finalidade corporal, e seu
próprio entendimento seria essencialmente corpóreo. No entanto, o filósofo
catalão diz que afirmar isso é ignorar a experiência, pois muitos homens vêem e
ouvem, mas não entendem muitas coisas e, “pelo contrário, entendem aquelas
coisas acima da natureza, como os milagres, a criação e a ressurreição, e
outras coisas semelhantes a essas. Além disso, o homem que tem os olhos
fechados e não ouve nada, entende ou pode entender. Portanto, o entender é de
outra natureza, mais elevada que aquela do corpo, e a chamamos de alma racional”.
Um
corpo sozinho não age, é pura potência material que, para ser movida – isto é,
passar da potência ao ato – precisa de um motor. Como bem sabe o maiorquino, um
corpo humano sozinho não entende nada, nem corporeamente, pois sem sua forma
substancial, a alma, ele não pode operar, e o ato de entender é uma operação da
alma. Assim, sem a alma, o homem sequer seria homem, pois tudo o que é privado
de sua forma substancial, que lhe imprime o ser, sofre corrupção e muda sua
natureza. Logo, um corpo humano sem alma não é homem, mas apenas um corpo que
se corrompe.
(Reflexões do prof. dr. Ricardo
Costa sobre o “Livro da Alma Racional” do Bem-aventurado Raimundo Lúlio)