quinta-feira, 29 de setembro de 2016

254ª Nota - A mentira da filantropia ou do humanitarismo


Uma das mais insidiosas influências na sociedade moderna provém daqueles que cultivam a consciência social sem atentar para a consciência individual, ou que fazem distinção entre amor do próximo e amor de Deus, ou ainda que supõem que, transferindo seu sentimento íntimo de culpa para outros que sua consciência social reprova, escapam com isso à noção de culpabilidade própria, aprovada pela consciência individual. Procurando auxiliar a reforma de outros, reconhecem a necessidade de regeneração, porém não a aplicam a si mesmos. Muitos casais desiludidos, chegados à maturidade, entregam-se a um derivativo qualquer para evitar encarar o problema de reformar internamente a família. Conferindo ao seu egocentrismo um caráter social, imaginam se terem tornado humanitários, quando na realidade a última coisa que fazem é imolar o egoísmo. Se for verdade que se dão a si mesmos aos outros, fazem-no da maneira que escolheram, e não daquela que sua natureza humana lhes dita, sob aspiração divina. Na realidade, não estão senão aumentando o próprio egoísmo, quando acreditam estarem se desprendendo dele. Contudo, essa extroversão não passa de uma excrescência de seu egocentrismo inato. O que realmente se encontra, na raiz desse curioso tipo de interesse social, é o ódio pela própria personalidade, que outros chegariam talvez a superar ou a afogar no álcool, mas que eles procuram esquecer numa tentativa altruística. Tais surtos de generosidade tentam encobrir uma sensação de esterilidade e futilidades totais. O egocentrismo dessas pessoas oculta-se então sob o manto do humanitarismo e da filantropia, porém não existe amor, por não haver sacrifício do ego. Há atividade incessante, mas não há alegria; há filantropia, mas não há paz interior; há uma consciência social, mas não existe consciência individual. O comunismo encontrado na ordem social é uma consequência do ateísmo presente nos corações humanos. Os mais sublimes anseios naturais da alma, as mais profundas aspirações do coração humano, são banidos em benefício do ego triunfante. O resultado é uma tremenda dissociação interna da personalidade, pois, quando a vida perde a sua unidade básica, sucede-lhe o mesmo que o corpo desligado da alma: desintegra-se em seus elementos componentes. Uma personalidade incapaz de sacrifício é fechada em si mesma e impenetrável aos demais.

(Dom Fulton J. Sheen, em O Mistério do Amor)