Não pode ser que
a Igreja Universal seja induzida a erro pelo Sumo Pontífice nas coisas que envolvem
a moral, e isso aconteceria ou poderia acontecer se pudesse errar nas
canonizações, pois se trata de um juízo público sobre a santidade e glória de
um homem defunto. E reevoca, com isso, Santo Tomás de Aquino, o qual diz que na
Igreja não pode haver erro condenável (é importantíssimo isso).
Ora, seria erro condenável se se
venerasse como santo um pecador, o que poderia induzir os fieis a erro.
Portanto, a Igreja não pode errar em tais casos.
O teólogo tomista Melchior
Cano diz: “É muito importante e costume comum de toda a Igreja saber
quem deve ser venerado com virtude de religião. Se a Igreja errasse nisso,
erraria gravemente em matéria moral. Não é diferente prestar culto ao diabo ou
a um danado. A Igreja erraria torpemente em matéria de moral se legiferasse de
prestar culto a um santo que, se não fosse santo, seria contra a razão do
Evangelho venerar. Os cânones dizem: ‘se alguém diz ser justo o injusto e
injusto o justo, é abominável aos olhos de Deus’. Similarmente, quem diz ser
santo quem não o é e não santo o santo é abominável aos olhos de Deus”. Eis o
primeiro argumento.
Santo Tomás de Aquino responde
essa dificuldade: “antes de tudo, o Papa não apenas baseia seu juízo em
pesquisas acuradas, mas goza nessa matéria da inspiração do Espírito Santo e a
Providência preserva a Igreja de ser enganada por tais testemunhos”. Portanto,
humanamente falando, um juízo histórico sobre alguém pode ser quase certamente
verdadeiro, mas alguma dúvida pode restar sempre. Mas a Igreja não é uma
sociedade puramente humana; é assistida por Deus em matéria de fé e de moral,
como o é nesse campo, pois a canonização dos santos diz respeito à fé e
à moral.
O culto de um santo é como uma
profissão de fé. Logo, o juízo do Papa, que lhe ordena o culto, deve ser
infalível. Santo Tomás de Aquino, Doutor Comum, diz “porque a honra que damos
aos santos é uma certa profissão de fé com a qual damos glória aos santos,
também nisso o juízo da Igreja não pode errar”.
Bem, a infalibilidade do Papa na
canonização dos santos faz parte do objeto secundário da infalibilidade. O
primário são as verdades explícita e formalmente reveladas por Deus; o
secundário são as verdades ligadas necessariamente à Revelação. Ou seja, a
Igreja tem a missão de guardar integralmente aquilo que Deus revelou, sem
acrescentar ou tirar nada, e de condenar tudo o que lhe é contrário, mas não
pode, concreta e eficazmente, realizar esse papel – que lhe foi dado por Deus e
que é a razão de sua existência – se não for infalível também nesse objeto
secundário, isto é, em todas as coisas tão estreitamente ligadas ao dado
revelado que, se não posso pronunciar-me infalivelmente a respeito, tampouco
poderei defender e transmitir com eficácia a Revelação de Deus.
Esse objeto inclui as conclusões
teológicas, os fatos dogmáticos, os decretos disciplinares e, no caso, as
canonizações e as aprovações definitivas das ordens religiosas.
Dom Fernando Ricossa
(Extraído em https://catolicoromano.com.br/author/don-ricossa/)