quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

291ª Nota - O fundamento do Direito



O problema. — Pode-se distinguir o fundamento do direito em geral, e o fundamento dos direitos concretos: este último chama-se título legal, isto é, o fato contingente em virtude do qual um direito dado pertence a uma pessoa determinada. (Exemplos: uma escritura de propriedade; um título de dívida pública; uma apólice de seguro).
A questão do fundamento do direito em geral, isto é, da causa eficiente do direito como tal, do princípio supremo de que decorre, tem sido objeto de discussão, que podemos assim resumir sucintamente:
Erros empiristas sobre a origem do direito. Os filósofos empiristas quiseram fundamentar o direito ora na necessidade (Helvetius): toda necessidade cria um direito, ora na força (Hobbes, Nietzsche), ora nas leis da sociedade civil (Spencer, Durkheim).
Estas teorias devem ser rejeitadas. Com efeito, a necessidade não pode criar o direito, pois como determinar o valor dos direitos que nascem de necessidades opostas? Seria necessário recorrer à força. Finalmente, o direito derivaria da força. — De outra parte, porém, a força não pode servir de base ao direito, pois o direito é um poder moral, enquanto que a força é de ordem física. Estas coisas são heterogêneas, e a força não pode produzir o direito tanto quanto do carvalho não pode nascer uma borboleta!
Enfim, a sociedade não é a fonte do direito, porque antes da sociedade civil existe a família, que já supõe um sistema de direitos, e também (como já observamos) porque a própria sociedade, para se fazer obedecer, apóia-se no direito, o que quer dizer que, longe de servir de base ao direito, ela o supõe.
Erro racionalista.  Kant quer que o direito se baseie na dignidade da pessoa humana, dignidade que se exprime na e pela liberdade moral. A liberdade seria, assim, o objeto de um respeito absoluto, como que constituindo o bem supremo do homem.
Ainda aí há um erro. A liberdade não é um absoluto: nada vale por si mesma, mas pelo uso que dela se faz. Outrossim, ela se submete à ordem moral, e a dignidade humana consiste em obedecer, livremente, a esta ordem moral. Definir-se-á, pois, antes, pela obediência do que pela liberdade, que é meio e não fim.
A LEI, FUNDAMENTO DO DIREITO. — É preciso, pois, ficar na doutrina que resulta de nosso estudo da lei, e segundo a qual o fundamento próximo do direito não difere da lei natural ou positiva legítima. Definimos, com efeito, o direito, como um poder moral; ora, só uma lei pode produzir um poder moral. Quanto ao fundamento último do direito, encontra-se na lei eterna, donde derivam todas as outras leis, naturais e positivas, e, destas, os direitos e os deveres.

(Extraído do Curso de Filosofia – Régis Jolivet)