O problema.
— Pode-se distinguir o fundamento do direito em geral, e o fundamento dos
direitos concretos: este último chama-se título legal, isto é, o fato
contingente em virtude do qual um direito dado pertence a uma pessoa
determinada. (Exemplos: uma escritura de propriedade; um título de dívida
pública; uma apólice de seguro).
A
questão do fundamento do direito em geral, isto é, da causa eficiente do
direito como tal, do princípio supremo de que decorre, tem sido objeto de
discussão, que podemos assim resumir sucintamente:
Erros empiristas sobre a origem do
direito. Os filósofos empiristas quiseram fundamentar o
direito ora na necessidade (Helvetius): toda necessidade cria um
direito, ora na força (Hobbes, Nietzsche), ora nas leis da
sociedade civil (Spencer, Durkheim).
Estas teorias devem ser
rejeitadas. Com efeito, a necessidade não pode
criar o direito, pois como determinar o valor dos direitos que nascem de
necessidades opostas? Seria necessário recorrer à força. Finalmente, o direito
derivaria da força. — De outra parte, porém, a força não pode servir de
base ao direito, pois o direito é um poder moral, enquanto que a força é
de ordem física. Estas coisas são heterogêneas, e a força não pode produzir o
direito tanto quanto do carvalho não pode nascer uma borboleta!
Enfim, a sociedade não é a fonte do
direito, porque antes da sociedade civil existe a família, que já supõe um
sistema de direitos, e também (como já observamos) porque a própria sociedade,
para se fazer obedecer, apóia-se no direito, o que quer dizer que, longe de
servir de base ao direito, ela o supõe.
Erro racionalista.
Kant quer que o direito se baseie na dignidade da pessoa humana, dignidade que
se exprime na e pela liberdade moral. A liberdade seria, assim, o objeto
de um respeito absoluto, como que constituindo o bem supremo do homem.
Ainda
aí há um erro. A liberdade não é um absoluto: nada vale por si mesma,
mas pelo uso que dela se faz. Outrossim, ela se submete à ordem moral, e a
dignidade humana consiste em obedecer, livremente, a esta ordem
moral. Definir-se-á, pois, antes, pela obediência do que pela liberdade, que é
meio e não fim.
A LEI, FUNDAMENTO DO
DIREITO. — É preciso, pois, ficar na doutrina que resulta de
nosso estudo da lei, e segundo a qual o fundamento próximo do direito não
difere da lei natural ou positiva legítima. Definimos, com efeito, o
direito, como um poder moral; ora, só uma lei pode produzir um poder
moral. Quanto ao fundamento último do direito, encontra-se na lei
eterna, donde derivam todas as outras leis, naturais e positivas, e,
destas, os direitos e os deveres.
(Extraído
do Curso de Filosofia – Régis Jolivet)