Analisemos agora um fato que – na
opinião de determinados autores – faz pressentir a monogamia como forma natural
do matrimônio. Trata-se da significativa circunstância de que a natureza produz
varões e mulheres quase no mesmo número. Esta afirmação não está em
conformidade com o que comumente se crê, ou seja: que o número de mulheres é
muito superior ao de homens (o que seria um argumento em favor da poliginia,
pois se tal ocorresse e esta não fosse admitida, de antemão se estaria
condenando grande parte do sexo feminino a não poder exercer o direito da
pessoa humana a fundar uma família).
Resumamos os dados estatísticos que
sobre este assunto nos oferece Landry, em seu “Tratado de
Demografia” (Adolphe Landry, Traité de démographie, Félix Alcan,
Paris, 1934, págs. 123-132): Nascem cerca de 105 meninos para cada 100 meninas,
mas, sendo o índice de mortalidade dos primeiros superior, logo se equilibram
os dois sexos, que se mantêm emparelhados durante a adolescência e a juventude,
e só a partir dos 35 anos aproximadamente é que começa a ser superior o número
de mulheres. Esta maioria do “sexo fraco” vai aumentando à medida que a idade
avança, de modo que, por volta dos 90 anos, nos defrontamos com 25 mulheres
para cada 10 homens, sendo mulheres quase todas as pessoas que chegam aos 100
anos.
Fixemo-nos no fato interessante de que é
a partir dos 35 anos que o número de mulheres começa a sobrepujar o de varões.
Isto é: só a partir de uma idade em que as mulheres começam a ser menos
atrativas e menos aptas para o matrimônio é que começa a haver mais mulheres do
que homens. Dir-se-ia que desde os 15 e até os 35 anos, a natureza procura
manter uma igualdade numérica dos sexos, como que facilitando ou solicitando o
emparelhamento.
Estendamo-nos um pouco mais sobre estes
dados, que deitam por terra a crença, tão difundida quanto distante da
realidade, acerca do excessivo número de mulheres em relação ao de homens.
Na Espanha, em 1960, de um total de
30.530.700 habitantes, 15.714.100 eram mulheres, o que significa 1.060 mulheres
para cada 1.000 homens (Anuário Estadístico de España, 1965).
No entanto, não se pense que o excedente
é sempre a favor do sexo feminino. Depende das circunstâncias que incidem sobre
os movimentos de população. Assim, no ano de 1940, enquanto na Bélgica havia
1.028 mulheres para cada 1.000 homens, nos Estados Unidos havia somente 989
mulheres para cada 1.000 homens, o que explica pelo fato de naquele país ser
notavelmente mais elevado o número de emigrantes varões. O mesmo ocorre –
segundo Landry – nos países em que as mulheres, por causas religiosas ou
sociais, são pior tratadas: na Índia, por exemplo, em 1941 havia 935 mulheres
para cada 1.000 homens.
Observemos que o que verdadeiramente tem
interesse é a semelhança entre o número de homens e mulheres. Pouco sentido
teriam aqui as exatidões matemáticas, dado que nem todos os homens e mulheres –
como indivíduos determinados – estão chamados ao matrimônio, algumas vezes por
enfermidade, outras por vocação superior, outras por razões familiares etc.,
razões que podem fazer desaconselhável para uma pessoa concreta o que é a lei
comum para a espécie.
Vejamos também outro fato muito
significativo; o incremento do número de varões que se produz depois das
guerras. Que fatores supraindividuais fazem com que na grande família humana se
movam ocultos recursos para que, com essa maior chegada de varões, se compensem
as mortes da guerra? A realidade é que não são conhecidos esses mecanismos, mas
trata-se de um fato comprovado. Na Bélgica, por exemplo, o “coeficiente de
masculinidade”, que, antes da guerra de 1914, era de 50,9% (porcentagem de
varões no total de homens e mulheres), subiu para 51,58% em 1919 e 51,45% em
1920, descendo depois paulatinamente, até situar-se em 1929 ao redor de 50,98%,
praticamente a mesma cifra anterior à guerra. Essa mesma tendência se observou
em outros países que intervieram no conflito, repetindo-se o fenômeno ao final
da segunda guerra mundial. Outro dado estatístico que nos indica como a
natureza parece tender ao emparelhamento de varões e mulheres.
Tudo o que até aqui se indicou não obsta
a que seja ligeiramente superior o número de mulheres em idade núbil sobre o de
homens. E a explicação é simples: o “circuito” matrimonial inclui um componente
de idade que é maior na mulher do que no homem, dado que a lei – reconhecendo o
desenvolvimento mais precoce daquela – concede à mulher a possibilidade de
casar-se dois ou três anos antes que o varão. Por isso, supondo que a idade
matrimonial nas mulheres seja – em média – três anos inferior à dos varões, se
num país nascem anualmente, admitamos, 100.000 meninos e 100.000 meninas, ao
passar os anos, as mulheres aptas para o matrimônio serão 300.000 mais que
homens.
Recordemos, finalmente, que à
equiparação em número de varões e mulheres (facilitando a possibilidade de
contrair matrimônio) vieram somar-se os favoráveis efeitos da revolução
industrial. Efetivamente, enquanto na economia puramente agrícola os filhos
mais novos estavam destinados a permanecer solteiros (a herança não podia ser
dividida em tantas parcelas quantas fossem os filhos, posto que só dava para
uma família), na economia moderna o trabalho é meio e condição suficiente para
poder fundar e sustentar um lar, tendo razão Schreiber ao escrever: “Com a
industrialização se apresenta pela primeira vez na história da humanidade a
possibilidade para o indivíduo de ganhar a vida e poder fundar uma família à
base unicamente de seu esforço”.
Já não é condição imprescindível possuir
terras para cultivar. Estamos diante do fato inegável de que a industrialização
e o regime de salário facilitaram a um grande número de pessoas poder exercer
esse direito fundamental da pessoa humana, que é o de constituir uma família.
(Luis
Riesgo Menguez, Doutor em Filosofia pela Universidade de Madri/Espanha, in A
Configuração da Família à Luz Exclusiva da Razão Natural, 1970)