VISÃO
PANORÂMICA DO OCIDENTE
Um dos mais eruditos professores da
Universidade de Harvard e dos mais respeitados sociólogos da atual América do
Norte, Carle Zimmermann, apesar de se não dizer católico, como Nelson Carneiro,
e de não pedir, como faz este deputado em sua campanha divorcista, nem ‘as
orações dos fiéis’ nem ‘a benção de Deus’; aquele sociólogo, no livro
intitulado ‘Family and Civilization’, faz uma interessante história do conceito
de Família, no Ocidente, e dos fatos que determinaram a degradação desse
conceito. Estudo tão imparcial e objetivo, que os leitores também objetivos e
imparciais hão de aplicar o processo que explicamos no Prefácio: a indução incompleta.
Se verificamos que o divórcio, nos outros países, é fruto de decadência moral,
temos o direito de concluir que, em nosso país, não seria fruto de coisa
melhor.
Vamos ler
Carle Zimmermann, obra citada, pgs. 553 a 556 – New
York and London, Harper and Brothers – 1947.
SÉCULOS XII – XIV
CONCEITO DE FAMÍLIA – Sacramento, união
santificada pela graça. Esposo e esposa, pais e filhos unidos
inquebrantavelmente. Homem e mulher unidos por toda a vida. O casamento começa
com o noivado (‘Sponsalia’).
PRINCIPAIS FONTES DESSE CONCEITO –
Autoridades eclesiásticas, autoridades do Direito Canônico e quase total
ausência de crítica da doutrina sobre família. Nenhuma lei civil sobre o
casamento.
SÉCULOS XV – XVI
CONCEITO DE FAMÍLIA – A família
considerada como união feita pelo homem, não mais como Sacramento, nem como
especificamente criada por uma autoridade divina. E à semelhança de todas as
coisas feitas pelo homem, o casamento podia ser dissolvido, sob condições
extremas. ‘Sponsalia’ (noivado) como começo de casamento, já começando a ser
discutido.
PRINCIPAIS FONTES DESSA QUEDA DE
CONCEITO – Lutero, Calvino, escritores protestantes, humanistas, certos
professores de Direito Canônico e uma minoria no Concílio de Trento, sendo esse
criticismo mais ativo em leis de velhos estados bárbaros.
SÉCULO XVII
CONCEITO DE FAMÍLIA – Assunto de Família
ainda sagrado, mas excluindo-se o Sacramento. As igrejas separadas querendo
regulamentar a Família, quase como a Igreja Católica... Os atos religiosos
tendem a tornar-se também um ato civil... O registro de casamento começa em
ambos os foros: religioso e civil.
PRINCIPAIS FONTES DESSA QUEDA DE
CONCEITO – Juristas alemães e norte-europeus. O período da revolução de
Cromwell, na Inglaterra. Em França, a legislação de Blois e outras leis uniram
a jurisdição civil e religiosa da Família. Nas colônias americanas, exigindo o
casamento civil, mas qualquer infração contra ele é punida severamente.
SÉCULO XVIII
CONCEITO DE FAMÍLIA – A Família é apenas
um contrato público. O clero presente como convidado, e não como autoridade...
Enfraquece a concepção de Família. A Revolução Francesa, marco na história do
divórcio, ao passo que a revolução inglesa, no século anterior, não o admitiu.
Começo da concepção de Família como exclusivamente um contrato civil. Aceitação
geral de uma ideia legislativa de divórcio. Divórcio absoluto em círculos não
católicos. Os elementos de Família enfraquecendo-se em seu controle de doutrina
sobre Família.
PRINCIPAIS FONTES DESSA QUEDA DE
CONCEITO – Margaret de Loraine, Montaigne, Rousseau, começo do movimento
feminista contra a Família. ‘Les philosophes du XVIII siécle ont
secularisé la conception du mariage’... Os mais conhecidos filósofos da
Alemanha e Inglaterra. As Famílias coloniais americanas voltam-se para o
casamento religioso, mas praticando a limitação da Família. Assim, a futura
população, nesse país, aumenta com a enchente de imigrantes, a começar pelos
escoceses, irlandeses e alemães do Palatinado.
SÉCULO XIX
CONCEITO DE FAMÍLIA – O mais fraco
possível. A ideia leiga e absoluta do divórcio espalha-se em todos os lugares,
com o código napoleônico e a revolução industrial. As leis americanas fazem da
Família um contrato privado. Divórcio para todos (‘Omnibus Divorce’). A
concepção ‘Fame sole’ liberta as pessoas da dominação de Família, disso
resultando as leis de Husband e reações como a Galicana, no séc. XVIII. Tudo
passa de Status para contrato. Idade não de Familismo, porém de individualismo
dourado. Os elementos individualistas ganham o controle da doutrina de Família.
O controle público da Família é seriamente deturpado.
PRINCIPAIS FONTES DESSA QUEDA DE
CONCEITO – As leis dos países europeus. A lei americana de Família. Irrupção do
conceito anti-familiar de Carlos Marx. A teoria evolucionista de aniquilamento
da Família ganha aceitação dominante. Começo do receio de superpopulação.
Aceitação geral do casamento sem filhos e poligamia sucessiva, como nos últimos
dias de Roma e da Grécia.
SÉCULO XX
CONCEITO DE FAMÍLIA – Contrato privado
de fato. A revolução russa quebra os laços da Família européia oriental. Medo
da dispopulação e das guerras. Estados ditatorias forcejam contra o familismo
(Alemanha, Rússia e Itália). Outros tentam comprá-lo por abono de Família
(França, Inglaterra, América e Suécia). Geral colapso dos valores da Família.
Alguns literatos têm receio das próprias doutrinas anti-familistas. Eminentes
lógicos e matemáticos escrevem contra o casamento e a Família. Concubinato e
formas secundárias de casamento, propostos por homens públicos. Pelo receio de
uma controvérsia moral, a dignidade do casamento é prostituída na imprensa, no
rádio e nas altas rodas. Os grupos individualistas e estadistas controlam a
doutrina sobre a Família. Esforços por reviver o controle público do Familismo.
PRINCIPAIS FONTES DESSA QUEDA DE
CONCEITO – REAÇÕES – Leis e propagandas em vários países. A Rússia abandona as
suas experiências. Os nazistas e fascistas fazem relacionar-se Familismo e
cidadania. A Lei americana de Família enche seis volumes e, na maior parte, não
satisfaz, segundo a opinião dos legisladores. Renasce o medo da subpopulação.
Acelera-se violentamente a rotura da Família, depois da Segunda Guerra Mundial,
o que prova um contramovimento. Polarização dos valores da Família, tanto
quanto no tempo de S. Basílio. Jornais “conservadores” atacam o Familismo como
sem valia e prejudicial. Pais presos por crimes de juventude. Os ricos defendem
o casamento como contrato privado.
CONCLUSÃO
De
tudo isso rebenta uma conclusão necessária: O divórcio não é fruto da
civilização, mas da decadência. Não é fruto da virtude, mas do mal. E quando o
deputado Nelson Carneiro, suplicar ‘as orações dos fiéis e a bênção de Deus’
para o seu Projeto de divórcio, saibamos dizer-lhe que os católicos só podem
rezar pelo que é bom, e que Deus não manda bênção, e sim maldição para o que é
mau.
Sirva-nos de exemplo a civilização de
outros países, tão demagogicamente evocada pelo mesmo deputado. Esses países
adotaram a lei do divórcio, é verdade, mas para ruína da Família e da própria
civilização. Exatamente o que diz o sociólogo americano: ‘Como nos últimos dias
de Roma e da Grécia’...
Convém
ainda lembrar que não somos nenhuma colônia de país europeu nem dos EUA,
assistindo-nos, portanto, o direito de reagir com aquela altivez com que Ruy
Barbosa reagiu, citando a ‘um dos maiores luminares na jurisprudência e nos
estudos sociais da Itália: Em matéria de autoridade quer-me parecer que alguma
coisa vale também a do povo italiano, entre as dos outros, ao menos quanto ao que
na Itália se tem de fazer’.
(Excerto
de AS FONTES DO DIVÓRCIO, Mons. Francisco de Sales Brasil, Editora Paulinas, II
Edição – 1953)