Vindo de dignidades semelhantes,
os deveres do pai não podem ser senão sagrados, e, portanto, formidáveis. Há
dois: O dever da vida, e o dever da educação.
Sobre o dever da vida não
insistirei.
Mas ser-me-á permitido dizer-vos,
meus senhores, qual é a vossa responsabilidade. Deus teve, portanto, essa
confiança em vós, deu-vos esta honra: abdicou, em vosso favor, o poder de
criar.
A espécie inteligente e livre, a
raça humana está nas vossas mãos. Mas esteja ou não esteja; multiplique-se
larga ou parcimoniosamente: isso depende de vós.
Seja nobre ou baixa,
resplandecente de virtudes ou podre de vícios: isso depende de vós.
Pode descer abaixo dos selvagens
ou dar-nos ainda muitos santos, como Clotilde, Luiz, Joana d'Arc, Vicente de Paulo; é a vós que compete decidir; e isso depende de cederdes aos atrativos das
paixões de colocardes a moral e a religião em vossos costumes; pois que, com o
poder de dardes a vida, tendes a necessidade de transmiti-la tal como a tendes,
tal como a preparastes. É uma responsabilidade a mais!
Atualmente (noto eu, meus
senhores) há homens que compreendem a honra e não recuam em face do sacrifício.
Refletem, rezam, consultam, quando é preciso; não temem a luz; procuram
lealmente a vontade de Deus: a lei divina é sagrada para eles.
Sabem que cuidados requer a saúde
de sua esposa, que é o bem dos filhos já nascidos; mas sabem também que é bom o
multiplicar a vida, e a sua confiança em Deus modera os receios que o futuro
lhes poderia inspirar. Toda a questão de ambição, de bem-estar, de egoísmo é
posta de parte: antes de tudo está o dever. A graça sacramental dar-lhes-á
força para cumpri-lo, sem dispensá-los do esforço pessoal. A tudo estão
decididos, menos a ofenderem a Deus; a todos os sacrifícios, a todas as
provações.
Dizem: se a Pátria tem o direito
de pedir-nos o nosso sangue para defendê-la, Deus também tem o direito de nô-lo
pedir para defender a moralidade do lar, que é o primeiro bem da pátria.
Dizem que há horas na vida em que
é preciso ser herói ou mártir, para cumprir com o dever; e serão heróis,
mártires, se preciso for, porque querem permanecer cristãos.
O sentimento das suas augustas
funções há de elevá-los ainda mais alto.
Conhecem toda a força da
hereditariedade, tanto na ordem física, como na ordem moral. Sabem que o pai
transmite a seus filhos, com o seu sangue, alguma coisa de sua alma, de suas
virtudes, de sua fé; e as bênçãos que Deus acrescenta, segundo as promessas da
Escritura, a esses bens da herança.
Sabem como se formam, de pais a
filhos, essas raças vigorosas, sãs de corpo e alma, e essas gerações fortes de
crentes, para as quais a fé já não é somente uma convicção individual, mas uma
herança; não somente a determinação livre de uma vontade pessoal, mas a
necessidade de um temperamento que a fé conquistou.
Sabem que com a fé são também as
virtudes do Evangelho que se tornam assim uma tradição de família, gravam-se no
coração de uma raça de preferência, e passam até ao sangue como uma herança
sagrada que se transmite de geração em geração e se vai enriquecendo a cada
transmissão, de sorte que esses descendentes da humanidade decaída, parecem
resgatados, desde o seio de suas mães.
Estes pensamentos sérios e os
sentimentos que trazem em sua conduta, em sua vida, em seu sangue, a sorte de
uma geração inteira fortificam, nesses pais cristãos - a força do dever;
ajudam-nos a vencerem os assaltos mais terríveis das paixões, e servem-lhes de
maravilhoso socorro nos desfalecimentos ou tentações, das quais nem os melhores
são excetuados.
A todos estes homens de coração e
de coragem, a todos estes valorosos da consciência e do dever, honra e
reconhecimento!
Não são só os pais da família e
da pátria: são os verdadeiros pais da humanidade regenerada, resgatada; salva;
os associados dos apóstolos, os continuadores da missão de Cristo, os
coadjutores de Deus!
Há outros que, infelizmente, por
leviandade ou descuido, por ambição ou libertinagem, ou não sei por que outras
paixões ainda, rebaixam e profanam as funções augustas e o sacerdócio sublime
da paternidade.
Há outros, contra os quais
Bossuet se levantava com indignação exclamando: “Desgraçadas das uniões, que
desejam ser estéreis, que não serão abençoadas, nem por Deus nem pelos homens!’
Queria falar dos pais avarentos
ambiciosos, egoístas, descrentes da Providência e do futuro, que, ludibriando o
desejo natural e alterando a ordem de Deus, rejeitam a paternidade como um fardo,
e reprimem o nascimento e a formação dessas nobres criaturas, dessas almas à
imagem de Deus, que deveriam oferecer ao céu como o fruto de sua bênção.
Há outros que, como a árvore das
florestas, atiram ao sopro de todas as paixões, a força misteriosa, cujo gérmen
divino está neles.
Alguns há também que profanam a
sua vida, antes de comunicá-la, que enfraquecem e desnaturalizam essa força que
lhes vem de Deus, e não transmitem senão um sangue debilitado, estragado, uma
vida rebaixada, uma alma que não tem senão vícios!
Todos estes quebraram o seu cetro
pelas suas próprias mãos; descoroaram-se eles mesmos; não são mais dignos de
serem chamados pais; ou, se é preciso ainda deixar-lhes esse nome, como
lembrança de sua antiga grandeza e sinal de sua queda, devem ser chamados os
pais do mal e do pecado; os pais do vício e do deboche, os pais da corrupção e
da morte, os continuadores, os coadjutores de Satanás!
Ó grandeza, ó santidade sublime
da paternidade, cujos deveres não podem ser cumpridos sem gerar o que há de
melhor, desconhecidos sem produzir o que há de pior!
Dos pais sem consciência, sem
virtudes, livrai-nos Senhor!... Mas os pais de consciência, cumpridores do seu
dever, virtuosos, cheios de heroísmo, os pais cristãos, abençoai-os, Senhor, e
multiplicai-os!
(Venerável
Padre Emmanuel-André)