quinta-feira, 9 de junho de 2016

205ª Nota - Sobre a fé e os hereges


Penetrada plenamente destes princípios, e cuidadosa de seu dever, a Igreja nada há desejado com tanto ardor nem procurado com tanto esforço que conservar do modo mais perfeito a integridade da fé. Por isso, há considerado como rebeldes declarados e expelido de seu seio a todos os que não pensam como ela sobre qualquer ponto de sua doutrina. Os arianos, os montanistas, os novacianos, os quartodecimanistas, os eutiquianos não abandonaram, seguramente, toda a doutrina católica, senão somente uma ou outra parte, e, sem embargo, quem ignora que foram declarados hereges e expulsos do seio da Igreja? Um juízo semelhante condenou a todos os fautores de doutrinas errôneas que apareceram nas diferentes épocas da história. “Nada é mais perigoso que esses heterodoxos que, conservando quase inteiramente a integridade da doutrina, com uma só palavra, como gota de veneno, corrompem a pureza e a simplicidade da fé que recebemos da tradição dominical, depois apostólica” (Santo Ambrósio).

Tal foi constantemente o costume da Igreja, apoiada pelo juízo unânime dos Santos Padres, que sempre consideraram como excluído da comunhão católica e fora da Igreja a qualquer que se separe no mais mínimo da doutrina ensinada pelo magistério autêntico. São Epifânio, Santo Agostinho, Teodoreto, mencionaram um grande número de heresias em seu tempo. Santo Agostinho notou que outras classes de heresias podem se desenvolver, e que, se alguém adere a uma só delas, por esse mesmo fato se separa da unidade católica.

“Se alguém dissesse que não crê nesses erros (isto é, nas heresias que acabamos de numerar), não se segue que deva acreditar-se e afirmar-se cristão católico. Pois pode haver e podem surgir outras heresias que não estão mencionadas nessa obra, e qualquer um que abrace uma só delas cessaria de ser cristão católico” (Santo Agostinho).

Este meio (o magistério da Igreja), instituído por Deus para conservar a unidade da fé, de que Nós falamos, é exposto com insistência por São Paulo em sua epístola aos Efésios, ao exortá-los, em primeiro lugar, a conservar a harmonia dos corações. “Sede solícitos em conservar a unidade do Espírito no vínculo da paz” (Ef. 4, 6); e como os corações não podem estar plenamente unidos pela caridade se os espíritos não estiverem conformes à fé, quer (São Paulo) que não haja entre os cristãos mais que uma só e mesma fé. “Um só Senhor e uma só fé”.

Ele quer uma unidade tão perfeita que exclua todo o perigo de erro, “a fim de que não sejamos crianças ao sabor das ondas, agitados por qualquer sopro de doutrina, ao capricho da malignidade dos homens e de seus artifícios enganadores”.  E ensina que esta regra deve ser observada não durante um período determinado, senão “até que todos tenhamos chegado à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, até atingirmos o estado do homem feito, a estatura da maturidade de Cristo”. Porém, onde pôs Jesus Cristo o princípio que estabelece esta unidade e o auxílio para conservá-la? Eis aqui: “A uns ele constitui apóstolos; a outros, profetas; a outros, evangelistas, pastores e doutores, para o aperfeiçoamento dos santos (cristãos), para o desempenho da tarefa que visa à edificação do Corpo de Cristo”.
(Excerto da Carta Encíclica Satis Cognitum, de Leão XIII)