Penetrada plenamente destes princípios,
e cuidadosa de seu dever, a Igreja nada há desejado com tanto ardor nem
procurado com tanto esforço que conservar do modo mais perfeito a integridade
da fé. Por isso, há considerado como rebeldes declarados e expelido de seu seio
a todos os que não pensam como ela sobre qualquer ponto de sua doutrina. Os
arianos, os montanistas, os novacianos, os quartodecimanistas, os eutiquianos
não abandonaram, seguramente, toda a doutrina católica, senão somente uma ou
outra parte, e, sem embargo, quem ignora que foram declarados hereges e
expulsos do seio da Igreja? Um juízo semelhante condenou a todos os fautores de
doutrinas errôneas que apareceram nas diferentes épocas da história. “Nada é
mais perigoso que esses heterodoxos que, conservando quase inteiramente a
integridade da doutrina, com uma só palavra, como gota de veneno, corrompem a
pureza e a simplicidade da fé que recebemos da tradição dominical, depois
apostólica” (Santo Ambrósio).
Tal foi constantemente o costume da
Igreja, apoiada pelo juízo unânime dos Santos Padres, que sempre consideraram
como excluído da comunhão católica e fora da Igreja a qualquer que se separe no
mais mínimo da doutrina ensinada pelo magistério autêntico. São Epifânio, Santo
Agostinho, Teodoreto, mencionaram um grande número de heresias em seu tempo.
Santo Agostinho notou que outras classes de heresias podem se desenvolver, e
que, se alguém adere a uma só delas, por esse mesmo fato se separa da unidade
católica.
“Se alguém dissesse que não crê nesses
erros (isto é, nas heresias que acabamos de numerar), não se segue que deva
acreditar-se e afirmar-se cristão católico. Pois pode haver e podem surgir
outras heresias que não estão mencionadas nessa obra, e qualquer um que abrace
uma só delas cessaria de ser cristão católico” (Santo Agostinho).
Este meio (o magistério da Igreja),
instituído por Deus para conservar a unidade da fé, de que Nós falamos, é
exposto com insistência por São Paulo em sua epístola aos Efésios, ao
exortá-los, em primeiro lugar, a conservar a harmonia dos corações. “Sede
solícitos em conservar a unidade do Espírito no vínculo da paz” (Ef. 4, 6); e
como os corações não podem estar plenamente unidos pela caridade se os
espíritos não estiverem conformes à fé, quer (São Paulo) que não haja entre os
cristãos mais que uma só e mesma fé. “Um só Senhor e uma só fé”.
Ele quer uma unidade tão perfeita que
exclua todo o perigo de erro, “a fim de que não sejamos crianças ao sabor das
ondas, agitados por qualquer sopro de doutrina, ao capricho da malignidade dos
homens e de seus artifícios enganadores”.
E ensina que esta regra deve ser observada não durante um período
determinado, senão “até que todos tenhamos chegado à unidade da fé e do
conhecimento do Filho de Deus, até atingirmos o estado do homem feito, a
estatura da maturidade de Cristo”. Porém, onde pôs Jesus Cristo o princípio que
estabelece esta unidade e o auxílio para conservá-la? Eis aqui: “A uns ele
constitui apóstolos; a outros, profetas; a outros, evangelistas, pastores e
doutores, para o aperfeiçoamento dos santos (cristãos), para o desempenho da
tarefa que visa à edificação do Corpo de Cristo”.
(Excerto
da Carta Encíclica Satis Cognitum, de Leão XIII)