Do Revmo.
Pe. Guido Logger, SS.CC., Assistente do Serviço de Informações
Cinematográficas, do Rio de Janeiro — órgão da A. C. B. — recebemos um artigo
intitulado «Que fazem os católicos no cinema?», com pedido de publicá-lo na
integra ou em resumo. É com satisfação que atendemos à solicitação. Como
dispomos de pouco espaço, resumiremos o trabalho de S. Revma., transcrevendo os
trechos que nos parecem mais importantes. Acrescentaremos, como contributo
nosso, alguns comentários sobre o apostolado do cinema.
O Revmo.
Pe. Guido Logger lembra a preocupação que a Santa Sé tem mostrado com relação
ao assunto. Além das grandes Encíclicas «Vigilanti Cura», de Pio XI, e «Miranda
Prorsus», de Pio XII, encontramos referências ao cinema em dezenove alocuções
ou escritos do Pontífice a pouco falecido, sendo que um do seus discursos
versou especialmente sobre o «filme ideal».
Os
motivos que levam Roma a interessar-se pelo cinema são óbvios: diversão para
multidões, tem ele influencia incomensurável sobre inúmeras almas. Quem sabe
que a missão da Igreja Lhe impõe velar sobre a formação dos povos, das famílias
e dos indivíduos, compreende que veja Ela com verdadeira angustia a orientação
que vai tomando o divertimento mais popular de nossos dias.
De fato,
há hoje no mundo 137.000 salas de exibição, que vendem anualmente quase 13
bilhões de entradas. E qual o valor moral das películas?
«Os
filmes — comenta o articulista — para render, devem corresponder ao gosto do
uma multidão de gente sem sensibilidade artística, de gente que deseja fugir
por algumas horas da realidade cotidiana, sonhar com uma felicidade mesmo
fictícia; numa palavra, um filme precisa satisfazer a todos. Por isso,
encontramos na produção cinematográfica, 95% de obras estandardizadas. Com os
mesmos tipos humanos, as mesmas concepções de vida... Desta maneira, enche-se a
fantasia do espectador com idéias e desejos saídos de películas feitas sob
medida, e vai-se deformando lenta mas seguramente a sua concepção da vida. Foge
ele da realidade de sua própria existência para encontrar a mentira, que toma
por verdade».
Outros
filmes afastam-se «dessa modalidade, e entre esses há, muitas vezes, os que
trazem a marca da arte cinematográfica, apresentam o mal como o que há de mais
natural no mundo, ou lhe dão a aparência do bem ou do permitido».
Essas
considerações justificam plenamente a existência de organismos aplicados
especificamente ao apostolado do cinema. Entre eles, o Revmo. Pe. Guido Logger
cita três principais:
1) A
Comissão Pontifícia para o Cinema, o Rádio e a Televisão, estabelecida em 1954.
Sem
caráter oficial, o «Office Catholique International du Cinéma» (OCIC), com sede
em Bruxelas, que reúne representantes de trinta e dois países. É um centro de
estudos e de informações.
No Brasil
há, desde 1938, o Serviço de Informações Cinematográficas (SIC), com sede no
Rio de Janeiro e cento e oitenta correspondentes em vários Estados. Empenha-se
especialmente na crítica e classificação moral de filmes.
Em
resumo, esse o artigo do Revmo. Assistente do SIC, útil não só para informação
dos leitores, como também porque salienta de modo claro e convincente o perigo
enorme que constitui atualmente o cinema, devido à má orientação a que obedece.
PERIGOS
DO APOSTOLADO DO CINEMA
No mesmo
sentido, «Catolicismo» teve oportunidade de trazer ao conhecimento de seus
leitores, na «Correspondência» de seu no 60, de dezembro de 1955, esta enérgica
afirmação do Cardeal Schuster, proferida em 19 de janeiro de 1952: “Em vinte e
cinco anos de episcopado, nada me proporcionou tantas magoas e preocupações
como os cinemas paroquiais... Condenamos novamente, em matéria cinematográfica,
a doutrina do mal menor. A Igreja, que, por essência, é santa, nunca pode
oferecer o mal menor”.
Como se
vê, o apostolado do cinema não está isento de graves perigos. O maior deles é,
devido a uma insensível influência do meio cinematográfico, Ir a pessoa aos
poucos amortecendo seu critério moral, de maneira que termine, mesmo sem má
intenção, por deixar passar como bem o que a Moral reprova.
Um
exemplo atual temos nas discussões havidas por ocasião das Jornadas promovidas
pelo OCIC em Paris, em julho do ano findo. Numa das reuniões ventilou-se a
questão do cinema russo. Todos estavam de acordo quanto ao fato de que os
filmes soviéticos constituem propaganda da ideologia ou dos desígnios imediatos
da Rússia. Não obstante, houve quem quisesse aprová-los tais quais são em si,
objetiva e esteticamente, prescindindo das intenções de seus realizadores. Por
fim, triunfou a opinião do polonês Ruszkowski, atualmente professor
universitário em Lima, que os rejeitava, não por motivos propriamente morais,
mas porque os russos, desrespeitando a liberdade artística, dirigem a produção
e a distribuição com intuitos de propaganda. Por aí se vê que no seio do
próprio OCIC não faltam os que reputam de somenos importância o critério moral
quando se hão de julgar manifestações de arte. A consequência é das mais
graves.
Graças a
Deus, tal concepção foi claramente repelida pela quinta conclusão dessas
Jornadas Cinematográficas. Faz ela votos de que os críticos, “justamente
preocupados pelo aspecto estético de uma obra, não esqueçam por esse motivo a
hierarquia de valores, e não deixem nunca de ressaltar o ponto de vista moral,
recordando que o cinema deve ser digno do homem”.
Infelizmente,
esse primado absoluto do moral, que comanda toda a estética, é com frequência
esquecido pelos que se dedicam ao apostolado do cinema. Lemos numa revista
católica, na secção cinematográfica, uma nota necrológica sobre o ator Tyrone
Power, que, como se sabe, não primava pelo respeito à lei de Deus. A notícia
tem grande destaque, ocupa a parte central da página, e é ilustrada pelo clichê
do artista desaparecido. E a certa altura, sai-se com esta, sem a menor censura,
como se fosse a coisa mais natural do mundo um homem trocar de esposa a seu
talante, e como se as uniões adulterinas merecessem o título nobre de
“matrimonio”: “Acompanhara-o a Madrid sua esposa Desbie Ann Minardos, com quem
se casara há menos de um ano e que espera o primeiro filho. Power contraíra
matrimonio duas vezes anteriormente: com a atriz francesa Annabella e com a
mexicana Linda Christian”.
Longe de
nós taxar a revista de tendenciosa; acreditamos antes que seja isso fruto de
uma como que insensibilidade criada pelo meio deletério com que é forçado a
conviver seu redator cinematográfico. Mas, que críticos católicos percam assim
a acuidade de julgamento, é coisa que merece a maior atenção, pelas
consequências de ordem social que encerra, uma vez que o cinema cria
mentalidade, vence revoluções, segundo a frase de Lenine: «De todas as artes, o
cinema é para nós a mais importante».
UM
ASPECTO IMPORTANTE
Não
queremos encerrar estas notas sem abordar um aspecto muito importante do
problema. Num inquérito realizado nesta Diocese sobre a influência dos filmes,
um congregado mariano fez a seguinte observação: o pior do cinema não está
propriamente em exibir por vezes cenas lúbricas, e sim em apresentar a vida
comum, ordinária e normal, sem a menor nota de Religião. Isso tende a lançar os
espectadores no indiferentismo. — Quem poderá negar a procedência de tal
observação, quer quanto ao fato que registra, quer quanto à consequência que
assinala?
Por tudo
isso, julgamos das mais acertadas a opinião do Exmo. Sr. Bispo de Salto, no
Uruguai: “Cremos que seja coisa fora de dúvida: com cinema não tiraremos jamais
os católicos do cinema. Ou os tiramos com piedade e vida sobrenatural, ou não
os tiramos”. Vê-se que S. Excia. Revma. Mons. Alfredo Viola considera o cinema
— ao menos como ele existe hoje — um mal a ser evitado, muito mais do que uma
diversão a ser frequentada.