sábado, 20 de outubro de 2018

401ª Nota - Que fazem os católicos no cinema?



Do Revmo. Pe. Guido Logger, SS.CC., Assistente do Serviço de Informações Cinematográficas, do Rio de Janeiro — órgão da A. C. B. — recebemos um artigo intitulado «Que fazem os católicos no cinema?», com pedido de publicá-lo na integra ou em resumo. É com satisfação que atendemos à solicitação. Como dispomos de pouco espaço, resumiremos o trabalho de S. Revma., transcrevendo os trechos que nos parecem mais importantes. Acrescentaremos, como contributo nosso, alguns comentários sobre o apostolado do cinema.

 13 BILHÕES DE ENTRADAS POR ANO

O Revmo. Pe. Guido Logger lembra a preocupação que a Santa Sé tem mostrado com relação ao assunto. Além das grandes Encíclicas «Vigilanti Cura», de Pio XI, e «Miranda Prorsus», de Pio XII, encontramos referências ao cinema em dezenove alocuções ou escritos do Pontífice a pouco falecido, sendo que um do seus discursos versou especialmente sobre o «filme ideal».
Os motivos que levam Roma a interessar-se pelo cinema são óbvios: diversão para multidões, tem ele influencia incomensurável sobre inúmeras almas. Quem sabe que a missão da Igreja Lhe impõe velar sobre a formação dos povos, das famílias e dos indivíduos, compreende que veja Ela com verdadeira angustia a orientação que vai tomando o divertimento mais popular de nossos dias.
De fato, há hoje no mundo 137.000 salas de exibição, que vendem anualmente quase 13 bilhões de entradas. E qual o valor moral das películas?
«Os filmes — comenta o articulista — para render, devem corresponder ao gosto do uma multidão de gente sem sensibilidade artística, de gente que deseja fugir por algumas horas da realidade cotidiana, sonhar com uma felicidade mesmo fictícia; numa palavra, um filme precisa satisfazer a todos. Por isso, encontramos na produção cinematográfica, 95% de obras estandardizadas. Com os mesmos tipos humanos, as mesmas concepções de vida... Desta maneira, enche-se a fantasia do espectador com idéias e desejos saídos de películas feitas sob medida, e vai-se deformando lenta mas seguramente a sua concepção da vida. Foge ele da realidade de sua própria existência para encontrar a mentira, que toma por verdade».
Outros filmes afastam-se «dessa modalidade, e entre esses há, muitas vezes, os que trazem a marca da arte cinematográfica, apresentam o mal como o que há de mais natural no mundo, ou lhe dão a aparência do bem ou do permitido».
Essas considerações justificam plenamente a existência de organismos aplicados especificamente ao apostolado do cinema. Entre eles, o Revmo. Pe. Guido Logger cita três principais:
1) A Comissão Pontifícia para o Cinema, o Rádio e a Televisão, estabelecida em 1954.
Sem caráter oficial, o «Office Catholique International du Cinéma» (OCIC), com sede em Bruxelas, que reúne representantes de trinta e dois países. É um centro de estudos e de informações.
No Brasil há, desde 1938, o Serviço de Informações Cinematográficas (SIC), com sede no Rio de Janeiro e cento e oitenta correspondentes em vários Estados. Empenha-se especialmente na crítica e classificação moral de filmes.
Em resumo, esse o artigo do Revmo. Assistente do SIC, útil não só para informação dos leitores, como também porque salienta de modo claro e convincente o perigo enorme que constitui atualmente o cinema, devido à má orientação a que obedece.

PERIGOS DO APOSTOLADO DO CINEMA

No mesmo sentido, «Catolicismo» teve oportunidade de trazer ao conhecimento de seus leitores, na «Correspondência» de seu no 60, de dezembro de 1955, esta enérgica afirmação do Cardeal Schuster, proferida em 19 de janeiro de 1952: “Em vinte e cinco anos de episcopado, nada me proporcionou tantas magoas e preocupações como os cinemas paroquiais... Condenamos novamente, em matéria cinematográfica, a doutrina do mal menor. A Igreja, que, por essência, é santa, nunca pode oferecer o mal menor”.
Como se vê, o apostolado do cinema não está isento de graves perigos. O maior deles é, devido a uma insensível influência do meio cinematográfico, Ir a pessoa aos poucos amortecendo seu critério moral, de maneira que termine, mesmo sem má intenção, por deixar passar como bem o que a Moral reprova.
Um exemplo atual temos nas discussões havidas por ocasião das Jornadas promovidas pelo OCIC em Paris, em julho do ano findo. Numa das reuniões ventilou-se a questão do cinema russo. Todos estavam de acordo quanto ao fato de que os filmes soviéticos constituem propaganda da ideologia ou dos desígnios imediatos da Rússia. Não obstante, houve quem quisesse aprová-los tais quais são em si, objetiva e esteticamente, prescindindo das intenções de seus realizadores. Por fim, triunfou a opinião do polonês Ruszkowski, atualmente professor universitário em Lima, que os rejeitava, não por motivos propriamente morais, mas porque os russos, desrespeitando a liberdade artística, dirigem a produção e a distribuição com intuitos de propaganda. Por aí se vê que no seio do próprio OCIC não faltam os que reputam de somenos importância o critério moral quando se hão de julgar manifestações de arte. A consequência é das mais graves.
Graças a Deus, tal concepção foi claramente repelida pela quinta conclusão dessas Jornadas Cinematográficas. Faz ela votos de que os críticos, “justamente preocupados pelo aspecto estético de uma obra, não esqueçam por esse motivo a hierarquia de valores, e não deixem nunca de ressaltar o ponto de vista moral, recordando que o cinema deve ser digno do homem”.
Infelizmente, esse primado absoluto do moral, que comanda toda a estética, é com frequência esquecido pelos que se dedicam ao apostolado do cinema. Lemos numa revista católica, na secção cinematográfica, uma nota necrológica sobre o ator Tyrone Power, que, como se sabe, não primava pelo respeito à lei de Deus. A notícia tem grande destaque, ocupa a parte central da página, e é ilustrada pelo clichê do artista desaparecido. E a certa altura, sai-se com esta, sem a menor censura, como se fosse a coisa mais natural do mundo um homem trocar de esposa a seu talante, e como se as uniões adulterinas merecessem o título nobre de “matrimonio”: “Acompanhara-o a Madrid sua esposa Desbie Ann Minardos, com quem se casara há menos de um ano e que espera o primeiro filho. Power contraíra matrimonio duas vezes anteriormente: com a atriz francesa Annabella e com a mexicana Linda Christian”.
Longe de nós taxar a revista de tendenciosa; acreditamos antes que seja isso fruto de uma como que insensibilidade criada pelo meio deletério com que é forçado a conviver seu redator cinematográfico. Mas, que críticos católicos percam assim a acuidade de julgamento, é coisa que merece a maior atenção, pelas consequências de ordem social que encerra, uma vez que o cinema cria mentalidade, vence revoluções, segundo a frase de Lenine: «De todas as artes, o cinema é para nós a mais importante».

UM ASPECTO IMPORTANTE

Não queremos encerrar estas notas sem abordar um aspecto muito importante do problema. Num inquérito realizado nesta Diocese sobre a influência dos filmes, um congregado mariano fez a seguinte observação: o pior do cinema não está propriamente em exibir por vezes cenas lúbricas, e sim em apresentar a vida comum, ordinária e normal, sem a menor nota de Religião. Isso tende a lançar os espectadores no indiferentismo. — Quem poderá negar a procedência de tal observação, quer quanto ao fato que registra, quer quanto à consequência que assinala?
Por tudo isso, julgamos das mais acertadas a opinião do Exmo. Sr. Bispo de Salto, no Uruguai: “Cremos que seja coisa fora de dúvida: com cinema não tiraremos jamais os católicos do cinema. Ou os tiramos com piedade e vida sobrenatural, ou não os tiramos”. Vê-se que S. Excia. Revma. Mons. Alfredo Viola considera o cinema — ao menos como ele existe hoje — um mal a ser evitado, muito mais do que uma diversão a ser frequentada.